Irmã Ana Maria

 

"O melhor lugar do mundo é onde Deus me quer". São José Freinademetz

Ir. Ana Maria - "... a AIDS já é considerada uma pandemia no País, eu aproveitava também para falar sobre a doença, os cuidados que se deve ter e como evitar a contaminação por seu vírus transmissor, o HIV."

 


Cheguei a Moçambique no início do ano de 2000. Vim para fazer companhia às duas Irmãs, Marta e Rosil, ambas originárias do Brasil Sul, que estavam numa comunidade, na Província de Nampula, região Norte de País. Monapo é uma das principais vilas da referida Província. Os padres SVD assumiram duas paróquias na região, uma em Monapo e outra em Quixote. As Irmãs trabalham nas duas. Naquela época, Irmã Rosil dava aulas na escola secundária e Irmã Marta era responsável pela pastoral em geral e ainda, fazia um trabalho de atendimento às pessoas com queimaduras e picadas por cobra. Por não haver soro antiofídico, usamos até hoje a Pedra Preta, uma pedra feita de ossos da perna do boi. O atendimento é precário, pois não temos material ou instrumentos para curativos.

Assim que cheguei, assumi os curativos e as pessoas picadas de cobras. Aprendi com Irmã Marta a fazer as pomadas de aloés, tansagem e picão, para os curativos de queimaduras. Também assumi os trabalhos da casa. 

Quando havia encontros com as comunidades, durante os cursos de casais, catequese e outros, eu aproveitava para falar aos grupos sobre as crianças, as mães gestantes, a alimentação das mães e das crianças, higiene etc. 

A pobreza é grande nessa província; há falta de alimentação adequada e, muitas vezes, mesmo do que comer, o que à total desnutrição e morte prematura. Isso é algo que ocorre normalmente no dia a dia das famílias. Como a AIDS já é considerada uma pandemia no País, eu aproveitava também para falar sobre a doença, os cuidados que se deve ter e como evitar a contaminação por seu vírus transmissor, o HIV. 

As vítimas principais das queimaduras são as crianças. Como a maioria não tem fogão em casa, as pessoas cozinham em trempe de três pedras, no meio da casa. As crianças, curiosas ou famintas, metem a mão na panela de papa fervente, ou pisam no fogo, ao ainda, derramam-se água fervente. 

As picadas de cobras nos tempos de chuva chegam a três por dia. Mesmo à noite, quantas vezes estava na cama quando a campainha tocava; levantava para botar pedra nas picadas e orientar a pessoa sobre os cuidados a serem tomados. Algumas não conseguem caminhar, são trazidas nos braços dos familiares ou então, de bicicleta, quando as têm.

Em 2001, assumi grupos de casais em duas outras paróquias, estas dirigidas pelos padres Espiritanos. A cada dois meses eu ia nos finais de semana para uma formação de três dias. Foi-me solicitada ajuda no Centro de Formação, para dar aulas no curso elementar para parteiras. Assumi aulas de obstetrícia cinco vezes por semana. Em 2002 assumi também os casais das nossas paróquias, Monapo e Quixote, já que Irmã Marta, que era responsável por isso, foi transferida para outra Província. Esse foi um trabalho muito precioso, gostei de trabalhar com as pessoas mais pobres e humildes, mesmo não sabendo falar a língua dava para entender o povo, principalmente as mamãs. Na escola, com o grupo de mulheres parteiras, foi também uma experiência forte, eram mulheres de 20 a 30 anos, todas muito alegres, foi agradável trabalhar naquele lugar. O povo acolhedor, a alegria das crianças, mesmo famintas, é algo impressionante. O povo tem interesse em aprender, quer ouvir, tem confiança e em geral tem muito respeito pelas Irmãs.

Em 2003, quando voltei das férias no Brasil, ainda em Maputo recebi transferência para Guro. Cheguei no dia 27 de março e no dia seguinte já viajei para a Província de Manica, chegando em Guro, meu destino final, no dia 30 de março. São dois dias de viagem. 

Quando aqui cheguei, as Irmãs estavam com febre (malária) e quando elas melhoraram, a febre me atacou. Graças a Deus, depois de três dias já estava melhor. Foi difícil essa saída de Monapo, tendo que deixar o trabalho agradável que eu fazia, chegando aqui tudo novo, pessoas diferentes, outra tribo, cada uma é diferente. Assumi os trabalhos da casa e, no final do ano, consegui reunir um grupo de casais, sendo que apenas um deles era casado na igreja, outros estavam casados tradicionalmente, e dois estavam com a segunda mulher. 

No início de 2004, assumi a coordenação da comunidade. Fiquei só por algum tempo, pois as Irmãs foram transferidas. Logo, porém, chegaram as Irmãs Alice, filipina e Mônica, da Argentina. Em julho Maria, do Brasil Sul, veio também integrar nossa comunidade.

Nosso trabalho aqui em Guro é de catequese em geral. Todos são catecúmenos, uma vez que não há ainda batizados. Por isso, o trabalho é mais exigente, temos a formação de catequistas, de lideranças comunitárias, celebradores da Palavra, leitores etc.

A poligamia é muito grande, há catequistas com cinco ou mais mulheres, às vezes numa comunidade ou em várias onde reunimos as lideranças, por exemplo, 30 pessoas, todos casados, quando se vai mais a fundo percebe-se que apenas dois jovens têm uma única mulher. Isso dificulta o trabalho, é a primeira evangelização. 

A língua oficial do País é o português, mas na Província há mais de trinta dialetos. Há pessoas no interior que não entendem nada de português, principalmente mulheres. Irmã Mônica e eu assumimos a formação de lideranças em duas zonas com 4 e 6 comunidades. Uma vez por mês tínhamos curso e encontros. Aos domingos íamos às comunidades para celebrar a Palavra com o povo. Numa dessas ocasiões, em 8 de maio, estávamos indo a uma dessas comunidades, distante 120km de nossa casa, quando, já próximas da comunidade, nosso carro saiu da estrada que, por sinal é muito ruim, a Irmã que dirigia perdeu o controle do carro e este foi parar no mato. Depois de bater em uma árvore, virou. Ficamos no meio da floresta, onde passa um carro duas ou três vezes por semana, dificilmente passa alguém andando por lá. Tivemos sorte, enfim, pois depois de umas duas horas passou um carro cheio de gente e de cabritos, uma camioneta que vinha de outra vila. Eu já havia saído do carro pelo buraco da janela, que ficou com os vidros totalmente quebrados, a frente amassada, não houve mais recuperação. Irmã Mônica ainda estava presa dentro do carro, tive que libertá-la. Com um pedaço de vidro, consegui serrar o cinto e tirá-la das ferragens, já vomitando e quase desmaiando. Foi então que ouvi o barulho do carro, saí até a estrada para pedir socorro. Graças a Deus, invocamos o Espírito Santo a todo o instante, pois se não morremos foi pela proteção de Deus. Todos que viam como o carro ficou pensavam que ali seguramente havia morrido alguém.

Agora estamos sem carro e, com isso, o trabalho nas comunidades distantes ficou prejudicado neste segundo semestre. Fazemos os atendimentos aqui na Vila às famílias, a um grupo de mulheres, além da preparação ao batismo, crisma e da animação das liturgias dos domingos.

Aqui, o poder aquisitivo das pessoas é muito melhor, as pessoas não são tão necessitadas, não vêm à porta pedir coisas. Mas, em compensação, em matéria de evangelização, está muito atrás da província de Nampula (Monapo), por isso, o trabalho é mais difícil e cansativo. Quando deixei Monapo, deixei também os trabalhos de que gostava tanto, os grupos já caminhando bem. Então pensei, eu vim aqui para servir, portanto, seja onde for, Deus sabe o que faz. É a Ele que eu sirvo.

Irmã Ana Maria de Souza, SSpS
pertence a Província de Moçambique
fevereiro/2005

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