Neste final de semana, a Diocese de Jales reúne os candidatos a prefeito dos quarenta e seis municípios que compõem o seu território. O convite foi feito a todos, indistintamente. O momento parece adequado. Definidas as candidaturas, antes que comece a campanha eleitoral, um encontro aberto, para um debate franco sobre os desafios que interessam a todos, candidatos e eleitores.

A primeira motivação da Diocese ao tomar esta iniciativa se liga à estreita vinculação que existe entre município e comunidade. Entre estas duas instâncias existe uma grande coincidência de fatores, que quase confundem sua identidade histórica, cultural e social. Muitos municípios levam o nome da própria comunidade, sobretudo através do padroeiro religioso. O cruzeiro de fundação continua sendo o marco histórico que assinala o início, tanto da comunidade religiosa como da vila que virou a cidade de hoje. Em termos de precedência histórica, foi a comunidade que gerou a instância política.

Esta coincidência de fatores explica a grande repercussão das eleições municipais nas comunidades. Geralmente produzem conflitos e abrem feridas, que levam tempo para cicatrizar. Um primeiro desafio para os candidatos, que a Diocese quer propor abertamente a todos eles, é a realização de campanhas que se atenham ao debate objetivo dos problemas atinentes à administração pública, e não descambem para acusações e ofensas pessoais.

Mas o interesse da Diocese não se limita à repercussão das eleições municipais nas comunidades. É a importância do próprio município que motiva a Diocese a olhar com solicitude as eleições, vendo nelas uma preciosa oportunidade de aprimoramento da prática democrática.

Na verdade, o município é a instância pública mais próxima à cidadania. É nele que o Estado efetiva sua primeira concretização. É pelo município que o Estado se apresenta ao cidadão, e é nele que o cidadão começa a exercer sua participação política.

Por esta proximidade, o município deveria ser um laboratório de cidadania e uma escola de participação política.

Mas esta proximidade é ambivalente. Se não é bem conduzida, envereda para a corrupção. E o município se torna, então, um laboratório de perversão do Estado.

Este o alerta que se faz necessário. É urgente recuperar a saúde política dos municípios, se queremos reconduzir o Estado brasileiro às suas verdadeiras finalidades. O campo de batalha mais adequado para a luta do saneamento político do país é o município. Pois nele acaba repercutindo o que existe de pior no Estado brasileiro, que é a sua tradição patrimonialista. Pensa-se o Estado como um patrimônio a ser pilhado e colocado a serviço dos interesses particulares de quem dele se apodera. Na verdade, é preciso constatar que a tradição política brasileira foi muito marcada pela tendência persistente de privatizar o Estado, pelo desvio de suas finalidades públicas para interesses particulares dos detentores do poder político.

Esta visão distorcida do Estado repercute diretamente nas campanhas eleitorais, que são vistas como expediente para se apoderar do aparelho estatal. Busca-se vencer as eleições não porque se quer aplicar um bom plano de governo, mas para garantir um bom salário para si próprio e para seus parentes, amigos e correligionários. Acaba se fazendo da campanha eleitoral um negócio, que empenha dinheiro e promete dinheiro. Assim se instaura a corrupção eleitoral, prenúncio da corrupção administrativa.

Isto conduziu muitas prefeituras à situação quase falimentar em que se encontram. Para beneficiar privilegiados, acumulam-se vantagens, multiplicam-se cargos em comissão, inúteis e onerosos, que inviabilizam economicamente o município.

Algumas administrações estão na UTI. Ou se faz com urgência uma reforma administrativa, ou se inviabiliza a função pública do município.

Estas as reflexões que a Diocese espera propor aos candidatos, apostando nas intenções democráticas de que querem se imbuir e com as quais podem impregnar a campanha eleitoral que está começando.

D. Demétrio Valentini - Bispo da Diocese de Jales