É conhecida esta advertência recorrente, exigida por lei, na propaganda de remédios: “se persistirem os sintomas, o médico deverá ser procurado”. Nem sempre os remédios resolvem. Há doenças muito graves, que requerem uma intervenção profissional, que diagnostique as causas, e providencie o tratamento conveniente.
O mesmo diagnóstico vale para a atual campanha eleitoral. Pois os sintomas da corrupção eleitoral persistem. Não bastam os remédios recomendados. É preciso chamar o médico!
A corrupção é câncer com raízes profundas na tradição política do Brasil. Ela produz a miséria do povo, e se nutre desta miséria. Sua perversidade transforma o remédio em veneno. Paga o pobre para que continue miserável.
O voto é a arma da democracia para corrigir as distorções sociais. Mas a política usa a miséria para comprar o voto dos pobres, com expedientes que burlam a lei eleitoral. Como peste daninha que assimila o veneno que é aplicado, a corrupção sabe se transmutar em ações que a dissimulam e a encobrem.
O primeiro sintoma do ressurgimento da corrupção eleitoral é o uso abundante de recursos financeiros. Certas campanhas viram alto investimento. O dinheiro corre em abundância, e os bairros pobres são os mais assediados.
Aí começam os expedientes para ludibriar a lei.
O primeiro deles é a contratação de cabos eleitorais, cuja remuneração tem correlação direta com o número de eleitores em cada família. Com isto a cidade fica inundada de portadores de bandeiras do referido candidato, na clara intenção de demonstrar sua popularidade e sua força eleitoral. Quanto mais bandeiras de um candidato, mais indícios de corrupção.
O outro expediente é a distribuição de camisetas, com propaganda do generoso candidato, que faz questão de levar a fama de empresário que ao menos em tempo de campanha resolve o problema do desemprego.
Mas a jogada mais sutil das camisetas está sendo armada para o dia das eleições. Como naquele dia a lei proíbe a ação ostensiva de cabos eleitorais, já está sendo feita a contratação de pessoas para circularem no dia da eleição com a camiseta do candidato. Com uma precaução esperta: o dinheiro só pode ser dado na véspera, para não oferecer ocasião de denúncia. É por isto que a noite do dia 02 de outubro está sendo muito bem planejada.
Existem também lances mais arrojados, que não se limitam a estes expedientes corriqueiros. Para manter toda uma região sob seu controle, alguns figurões políticos designam candidatos em cada cidade importante, e despejam neles seu dinheiro, para que, eleitos, continuem seus vassalos.
Outros candidatos já se preveniram há mais tempo, e se julgam agora no direito de fazer ameaças diretas a quem ousou questionar sua candidatura. Tais figuras se enquadram com justeza na descrição feita anos atrás pelo documento da CNBB que analisou a corrupção no país, e fez a seguinte constatação: “a corrupção se torna possível sobretudo com prefeitos autoritários, que conseguem apoio junto às corporações locais, sobretudo da imprensa escrita e falada. Tais administrações procuram maquiar o seu governo, com muita festa, mantendo se possível a cidade bonita, com muita publicidade para enganar a população”.
Esta praga não se cura com chás caseiros, feitos de pias recomendações e de cartilhas políticas com inocentes princípios. É preciso uma ação incisiva e contundente. Algumas iniciativas cabem à Justiça Eleitoral. Pois, no caso das eleições, ela é constituída em fiscal administrativo da execução de um processo em andamento, e que precisa ser realizado de acordo com as prescrições legais. Assim mesmo, a Justiça Eleitoral precisa ser acionada por denúncias devidamente comprovadas, feitas não só pelos partidos políticos, mas também por comitês de cidadãos, como recomenda a CNBB a respeito da Lei 9840.
Mas o remédio mais eficaz será sempre o voto dos cidadãos, que precisa se manter livre e imune dos assédios da corrupção eleitoral. Uma senha segura é votar contra os candidatos que ostentam seus nomes nas costas dos pobres.
D. Demétrio Valentini - Bispo da Diocese de Jales