Direito ao Alimento

Ainda sobre o discurso do Presidente do Brasil na ONU (21.09.2004), é de se pensar no quanto o processo de colonização garantiu a abundância alimentar aos colonizadores e dificultou o acesso ao alimento ao colonizados.
Simultaneamente, os brancos inventaram mitos para impedir que a população ingerisse certos alimentos. No Brasil expedientes foram usados para impedir que a população pobre tomasse leite. Por exemplo, dizia-se que esta rica fonte de proteínas e cálcio não deveria ser ingerida com certas frutas como a manga, o caju, a jaca,...
Entre indígenas de vizinhos países, os brancos afirmavam que a ingestão de ovos impedia que as crianças aprendessem a falar. Assim, ainda atualmente, ouvi de indígenas do Povo Makka afirmarem que tinham sido aconselhados a proibir as crianças de ingerissem ovos “para não atrasar a fala”.
Nossa linguagem corrente também denuncia a presença do pensamento colonialista. Quando dizemos “batata inglesa”, na verdade estamos nos referindo à batata cultivada por povos indígenas peruanos. Levada por europeus, salvou de ampla mortalidade que assolava seus povos.
Quando europeus invadiram terras americanas, o cultivo de milho e mandioca já era comum entre os povos indígenas. Alguns eram até chamado de “hombres del Mays”. As tortas de milho eram a base da alimentação, como o é, ainda hoje, a mandioca para muitas pessoas do nordeste.
O termo "garantia alimentar" foi cunhado na Segunda Grande Guerra do século XX. O acesso ao alimento determinava quem seria vitorioso. Divulgou-se a teoria da escassez de alimentos para matar a fome da população mundial, na época, não tão densa devido à ampla mortalidade pela guerra.
Hoje sabemos que não falta alimentos para os mais de 6 bilhões de seres humanos. O acesso é que é desigual como o é também aos demais bens.
Nos dias que vão o processo de colonização não é tão diferente. Basta lembrar o processo de privatização das fontes de água potável, a monocultura de exportação dificultando a produção de alimentos para consumo interno, ... o internacional cassino financeiro.
No referido discurso de Lula faltou a coragem de Julius Nyerere com sua memorável pergunta na ONU: devemos deixar morrer nossas crianças para pagar nossa dívida?
Um silêncio mortal foi a resposta, mas em 1991, o relatório da ONU afirmava:

Não se pode pretender que o crescimento físico e mental de uma criança espere até que as taxas de juros caiam, ou até que os preços dos bens de consumo se recuperem, ou até que o pagamento da dívida externa tenha sido reescalonado, ou até que a economia retome o crescimento, ou até que uma guerra termine (p.23).

16 de outubro, Dia Mundial da Alimentação, não temos o que comemorar diante do “uso dos alimentos como arma de pressão econômica e política contra países e movimentos populares”. O que acontece com alguns países da África subsaariana, brada aos céus. A fome não é devida à falta de alimentos; no Brasil, nem é uma questão de seca. É preciso reler obras de Josué de Castro escritas há mais de 50 anos.
As mulheres são responsáveis pela produção, disponibilização e preparação de mais de 50% dos alimentos do mundo. No entanto, são elas que menos têm acesso.
Nesses tempos de fugas de capitais pela CC5, é oportuno lembrar a coragem de Hélder Câmara na Suíça denunciando os banqueiros que “escondem o dinheiro, fruto da fome e da miséria de meu povo”. Faz-nos falta a coragem e tenacidade de Betinho.
No discurso de Lula faltou uma reflexão sobre os impactos do elevado “superavit primário”, assim como uma resposta aos mais de 12 milhões de assinaturas pedindo a Auditoria da Dívida, prevista na Constituição. Aqui vale a afirmação do Fórum sobre Soberania Alimentar: “a fome e a desnutrição crescem, não por ausência de alimentos, mas por ausência de direitos.”

Iolanda Toshie Ide
Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Lins;
Representante da Pastoral da Mulher Marginalizada no setor de Pastorais Sociais da CNBB;
Coordenadora do Grupo de Pesquisa e Ação " Educação e questões de Gênero", da UNESP de Marília / SP

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