Foucauld e o mistério de Nazaré

No último dia 13 de novembro, a Igreja proclamou beato o Irmão Carlos de Jesus. Charles de Foucauld nasceu na França, em Estrasburgo, em 15 de setembro 1858. Órfão aos 6 anos, cresceu com sua irmã Maria, sob os cuidados do avô, orientando-se para a carreira militar.

Adolescente, perde a fé. Conhecido por seu gosto da vida fácil, revela, não obstante, uma forte e constante atração pelas dificuldades. Empreendeu uma perigosa exploração a Marrocos (1883-1884). O testemunho de fé dos muçulmanos desperta em seu coração cético e cheio das vaidades do mundo um questionamento sobre Deus, levando-o a formular uma prece: "Meu Deus, se existir, faz que te conheça".

Dizia outro grande cristão francês, Blaise Pascal, que quando um homem começa a procurar a Deus é porque já o encontrou. Na verdade, Deus já nos encontra e nos ama muito antes que tenhamos a consciência de encontrá-lo e amá-lo. Assim foi com Charles de Foucauld.

Retornando à França depois de seu tempo no Marrocos, emociona-o muito a acolhida discreta e carinhosa de sua família, profundamente cristã, e começa a busca pelo Sentido da vida. Guiado por um sacerdote, o padre Huvelin, que ao angustiado jovem que o procura ordena ajoelhar-se e confessar. Charles encontra a Deus em outubro de 1886. Tem então 28 anos. O testemunho que dá de sua conversão é radical como será sua vida após ela: "Assim que compreendi que existia um Deus, compreendi que não podia fazer outra coisa senão viver só para Ele".

Durante uma peregrinação à Terra Santa descobre sua vocação: seguir Jesus em sua vida oculta de Nazaré. Passa 7 anos na Trapa, primeiro no mosteiro N.S. das Neves, depois Akbes, na Síria. Em seguida, ele viverá sozinho uma vida eremítica, na oração e adoração perto das Clarissas de Nazareth.

Ordenado sacerdote aos 43 anos (1901), parte para o Sahara, primeiro em Beni-Abbes, depois em Tamanrasset, em meio dos Tuaregues do Hoggar. Quer ir ao encontro dos mais afastados, "os mais esquecidos e abandonados". Quer que cada um dos que o visite o considerem como um irmão, "o irmão universal". Charles de Foucauld quer "gritar o evangelho com toda sua vida", em um grande respeito à cultura e à fé daqueles em meio aos quais vive.

Aspira a uma única coisa: ser cada vez mais semelhante a Jesus. Nesse sentido, diz: "Eu queria ser o bastante bom para que eles digam: Se tal for o servidor, como então será o Mestre...?". Foucauld mantinha uma abertura fraternal de sua casa, não a fechando a ninguém. Permanecia longas horas em oração diante do Santíssimo Sacramento, por quem tinha um entranhado amor. A Eucaristia foi o grande sol de sua vida. Com os muçulmanos com os quais se encontrava, agia como um terno irmão, procurando atraí-los, com grande respeito e fraternidade.

No entardecer de 1° de Dezembro 1916, foi morto por um bando de tuaregues que rodeou sua casa. Seu sangue foi bebido pela areia do deserto, onde entregara a vida em impressionante radicalidade. O Irmão Charles de Jesus sempre sonhou compartilhar sua vocação com outros: depois de ter escrito variadas regras religiosas, pensou que esta "vida de Nazareth" podia ser vivida em todas as partes e por todos. Atualmente, a "família espiritual do Charles do Foucauld" compreende várias associações de fiéis, comunidades religiosas e institutos seculares de laicos e sacerdotes.

Não teve a alegria de testemunhar isso em vida. Morreu praticamente sozinho, acompanhado apenas de um companheiro. No entanto, a irradiação de seu testemunho, após sua morte, gerou muitos seguidores, formando 11 congregações religiosas marcadas pelo mesmo espírito do amor de Cristo, gratuito e universal.

A vida do Beato Charles de Foucauld constitui iluminação de impressionante atualidade. Para a sociedade em que vivemos, marcada pela ganância e obsessão de ter e acumular bens, o exemplo de despojamento, pobreza e humildade radicais do antigo oficial francês pode ser extremamente benéfico. Para a Igreja que somos e sobretudo queremos ser, Charles de Foucauld é como uma luz fulgurante que nos fala da importância de voltar às origens, voltar ao mistério de Nazaré enquanto sinal de pobreza e serviço, deixando de lado toda ambição, toda sede de poder, buscando ser apenas sinal da presença de Jesus Cristo entre os homens e mulheres que buscam sofregamente um sentido para suas vidas neste início de milênio.

Maria Clara Lucchetti Bingemer
teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio

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